Estudo classifica bairros de Fortaleza quanto à propensão para epidemia grave de COVID-19

O estudo “Propensão à epidemia grave de COVID-19 da população residente em bairros do Município de Fortaleza”, conduzido por grupo interdisciplinar de pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC – Saúde Pública e Engenharia de Transportes), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz – Escola Nacional de Saúde Pública, Ensp), e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ – Instituto de Medicina Social, IMS), em parceria com a Prefeitura Municipal de Fortaleza (Secretaria Municipal de Saúde e Secretaria Municipal de Conservação e Serviços Públicos), classificou os bairros de Fortaleza quanto à propensão para epidemia grave de COVID-19.

 

Coordenado pelo professor José Ueleres Braga (UERJ/IMS & Fiocruz/Ensp), o grupo que inclui pela UFC perspectivas da Saúde Pública (Alberto Novaes Ramos Jr, Anderson Fuentes Ferreira, Edenilo Baltazar Barreira Filho), Engenharia de Transportes (Bruno Vieira Bertoncini, Francisco Moraes de Oliveira Neto, João Lucas Albuquerque Oliveira, Manoel Mendonca de Castro Neto, Verônica Teixeira Franco Castelo) e Geografia (Jader de Oliveira Santos), buscou responder a seguinte questão central: “Considerando a fase inicial da epidemia nos municípios da região metropolitana de Fortaleza, o fluxo de pessoas e a vulnerabilidade epidêmica da população, quais os bairros/áreas têm maior propensão de epidemia grave da COVID-19 ao longo de todo o período epidêmico?” Como representação da Prefeitura de Fortaleza, o grupo contou com a participação de Geziel dos Santos de Sousa (Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza), além de Renan Monteiro Carioca Freire e Victor Macêdo Lacerda (Secretaria Municipal de Conservação e Serviços Públicos de Fortaleza).

O estudo identificou, a partir da análise de 119 bairros da cidade, os 10% classificados com maior propensão à epidemia grave por COVID-19 ao longo de toda a epidemia: Aldeota, Cais do Porto, Vicente Pinzon, Praia do Futuro I, Praia do Futuro II, Arraial Moura Brasil, Barra do Ceará, Canindezinho, Centro, Cristo Redentor e Edson Queiroz, José de Alencar, Presidente Kennedy, Papicu e Vila Velha. No relatório além dos procedimentos metodológicos, estão apresentados os resultados e as recomendações potenciais.

O processo de construção da estimativa do escore de propensão dos bairros de Fortaleza foi baseado na combinação de diferentes indicadores analisados: 1- carga de infectividade; 2- carga de infecção e 3- índice de vulnerabilidade epidêmica populacional.

Carga de infectividade

A carga de infectividade foi analisada com base nos dados oficiais da vigilância epidemiológica da COVID-19 em Fortaleza. Todos os casos confirmados da COVID-19 notificados à Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza até 12 de março de 2020, residentes no município, foram incluídos. Considerou-se que esse período corresponde à fase inicial da epidemia, quando predominantemente casos importados (viajantes) iniciam a transmissão de SARS-CoV-2, para posteriormente casos autóctones serem detectados a partir de transmissão comunitária.

Carga de infecção

A carga de infecção foi medida a partir da combinação da carga de infectividade e da mobilidade populacional entre os bairros de Fortaleza. A mobilidade populacional foi baseada na pesquisa Origem-Destino do município para 2019. Trata-se de pesquisa amostral apontando os deslocamentos de pessoas, realizada por meio de entrevistas nos domicílios para observação de atividades e viagens realizadas por seus habitantes. Não foram considerados, nesta etapa da pesquisa, deslocamentos dentro de um mesmo bairro.

Índice de vulnerabilidade epidêmica populacional

O índice de vulnerabilidade epidêmica populacional foi construído pelo grupo de estudo de modo a representar atributos populacionais que mais representavam, de modo coletivo, a vulnerabilidade populacional à epidemia da COVID-19. Foram incluídos sete (7) indicadores sociodemográficos, baseados no censo brasileiro de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística: 1- proporção de domicílios com mais de dois, moradores por dormitório, 2- proporção de população analfabeta, 3- proporção de população em extrema pobreza, 4- proporção de domicílios sem água e banheiro, 5- proporção de desempregados, 6- Gini de renda familiar e 7- proporção de pessoas vivendo em aglomerados subnormais.

Por fim, a estimativa do escore de propensão foi calculado combinando a carga de infecção com o índice de vulnerabilidade epidêmica populacional. O cálculo foi realizado tanto por abordagem multiplicativa quanto somativa desses dois índices como forma de trazer perspectivas diferenciais deste escore. A abordagem aditiva considera que a carga de infecção acrescenta adicionalmente a vulnerabilidade epidêmica para a obtenção do escore de propensão à epidemia grave. No caso da abordagem multiplicativa o efeito é potencializado sinergicamente e estimado pela multiplicação dos dois índices.

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Recomendações destacadas

A pesquisa destaca algumas recomendações para os bairros com propensão a epidemia grave, reforçando a resposta adotada pela Prefeitura Municipal de Fortaleza:

  1. Reconhecimento dos casos de COVID-19 e investigação dos contatos, consolidados a partir das ações de vigilância epidemiológica
  2. Participação do Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (CIEVS) do município e do estado no desenvolvimento e avaliação de ações estratégicas voltadas para os bairros com maior propensão à epidemia
  3. Oferta e garantia de testes para diagnóstico da COVID-19 e da infecção por SARS-CoV-2 na rede de atenção
  4. Garantia de acesso na rede de atenção à saúde do município, em particular a atenção primária à saúde que deve ter um papel estratégico na classificação de risco para casos com ênfase na gravidade, considerando o impacto da COVID-19 em trabalhadores da saúde nestes bairros
  5. Sistema de referenciamento efetivo para a adequada condução dos casos
    identificados em cada ponto de atenção
  6. Atuação das equipes de atenção primária à saúde no desenvolvimento de ações específicas dentro de seu território, principalmente agentes comunitários de saúde e agente de combate a endemias, com vistas à identificação de casos de COVID-19, como também isolamento, quarentena e distanciamento social
  7. Ações de imunização voltadas para populações com maior risco e vulnerabilidade para influenza (por exemplo utilizando-se de estratégias de drive-thru / drive through)
  8. Adoção de medidas para redução da mobilidade populacional nos bairros: 1-fiscalização do fechamento dos setores de atividades não essenciais (comércio, lazer, prestação de serviços, indústrias), 2- alertas sonoros para a adoção de medidas de distanciamento social ampliado, isolamento e quarentena nas comunidades, 3- análise e monitoramento dos principais pontos de concentração no âmbito dos transportes, tais como pontos de parada, hubs de transferência ou ainda Terminais de Integração
  9. Monitoramento do nível de mobilidade populacional nos bairros, por meio de tecnologias disponíveis pela gestão municipal, para deslocamentos motorizados individuais (aplicativos eletrônicos, dados de fiscalização eletrônica), motorizados coletivos (bilhetagem eletrônica) e não motorizados (rastreamento celular, dados de sistemas de bicicletas compartilhadas), e por meio da demanda de passageiros por transporte público e da oferta de linhas e veículos em função da demanda, com atenção especial à redução de aglomeração de passageiros(as) nos veículos e nas paradas

O estudo busca influenciar positivamente a resposta do Município de Fortaleza à epidemia da SARS-CoV-2 como crítico problema de saúde pública, possibilitando aos gestores na adoção de medidas baseadas em evidências consistentes, oriundas de dados de diferentes setores.

Em seu conjunto, as análises de propensão à epidemia grave da COVID-19 na população residente em bairros do Município de Fortaleza visam fortalecer o Plano Municipal de Contingência para Enfrentamento da Infecção Humana por SARS-CoV-2, com alcance na resposta do próprio estado do Ceará.

O grupo segue nos estudos com perspectivas intersetoriais e interdisciplinares, avançando em análises contextuais de maior expressão da epidemia, incluindo aspectos de vulnerabilidade social e de vulnerabilidade da rede de atenção à saúde no Sistema Único de Saúde (SUS).

Clique aqui para acessar o relatório Covid-19 Fortaleza.

Fonte: Comitê de Enfrentamento à Covid-19 FAMED/UFC.